Aquela frase que dizia que o Brasil é um país jovem já não faz mais sentido. Hoje nós somos um país adulto, caminhando para a velhice. As mudanças na nossa sociedade e a importância de se preparar para essa fase da vida estão na primeira reportagem da série especial sobre os idosos.
Veja aqui a matéria publicada pelo Jornal Nacional.
Dona Terezinha vem de uma família com 22 irmãos e irmãs. Ela cresceu, casou-se e teve 11 filhos. A metade. Na vez dos filhos dela, 3 netos em cada casa, no máximo. Já os bisnetos serão menos ainda.
“Essa daqui só tem 1, essa tem 2, não quer muito, porque não dá não. E hoje tá mais difícil o estudo, é complicado”, conta a aposentada.
Todo mundo junto nem cabe na cozinha, mas a turma menos numerosa é a dos pequenininhos. A família da Dona Terezinha é o retrato da nossa população.
A maior parte dos brasileiros já está na idade adulta. É que, a cada geração, nos tornamos um país mais velho por dois motivos: temos menos crianças em casa, então a base da pirâmide demográfica fica mais estreita. E, à medida que vivemos mais, essa ponta vai ficando mais larga. Essa figura já está se transformando no que os estudiosos chamam de “bala de canhão”.
Em 1960, o Brasil tinha pouco mais de 3 milhões de idosos. Em 2010, já eram quase 20 milhões. Nesses 50 anos, ao mesmo tempo em que a população se urbanizou, a taxa de fecundidade caiu. De mais de seis filhos, em média, por mulher, pra menos de dois.
“O envelhecimento populacional já ocorre no Brasil em um ritmo acelerado. Essa é a nossa grande característica própria dessa dinâmica demográfica no século 21”, explica Jorge Félix, professor de Economia da Longevidade na USP.
A França levou 145 anos para dobrar a população de idosos. No Brasil, isso vai acontecer em apenas 25 anos, segundo as estimativas da Organização Mundial da Saúde.
“É o envelhecimento mais rápido no mundo, mas nós estamos envelhecendo ainda com pobreza. Os países desenvolvidos primeiro enriqueceram pra depois envelhecer, essa que é a grande diferença e o grande desafio para o Brasil”, avalia Alexandre Kalache, presidente do Centro de Longevidade Brasil.
Os sinais de envelhecimento começam no corpo da gente, bem aos poucos. É difícil perceber. Mas uma roupa especial ajuda. Ela deixa tudo mais pesado, como se tivesse menos força. E limita os movimentos. Além disso tudo, dessa falta de mobilidade, os idosos ainda têm problema com a visão. Os óculos, também especiais, tiram completamente a visão periférica. Você só consegue ver o que está na frente.
A calçada poderia estar em qualquer cidade brasileira. Mais um desafio: atravessar a rua na faixa de pedestre no tempo que o sinal de pedestre dá. Já era pouco tempo e foi preciso esperar três carros passarem. A conclusão é que é muito difícil e perigoso andar numa calçada como essa cheia de degraus, cheia de buracos, não é à toa que tantos idosos se acidentam nas cidades brasileiras.
O curso de graduação em gerontologia da Universidade de São Paulo é um dos poucos no Brasil nessa área.
“O idoso tá apenas numa fase da vida e a gente não estuda somente essa fase da vida, estudamos também o envelhecimento que começa desde que a gente nasce”, explica a estudante Isabel Landim, de 24 anos.
Os profissionais são preparados para cuidar dos idosos e administrar instituições.
“A pessoa só percebe que tem uma demanda especial quando já está na velhice. As cidades não se preparam. O governo não se prepara. A família não se prepara, e a própria pessoa não se prepara para o envelhecimento”, destaca a coordenadora do curso, Rosa Chubaci.
E o tempo cobra essa conta. Inácio trabalhou 30 anos como corretor de imóveis. Ganhava bem, mas nunca pensou em como seria a vida quando parasse. Não contribuiu para a Previdência e não conseguiu se aposentar. Aos 61 anos, vive em um abrigo.
“Eu não pensei bem no futuro, porque meu futuro na época eu tinha como presente. Não consegui guardar nada”, explica Inácio.
O abrigo tem convênio com a prefeitura. Recebe para cuidar de 62 idosos. Está com 72 e tem fila de espera.
“Outras pessoas estão envelhecendo, nós estamos envelhecendo, não tendo pra onde ir, vai pra rua. Não há uma preocupação com a população idosa, precisa de uma conscientização pra não chegarmos a isso”, afirma a gerente do centro de acolhida, Vanderléia Soares.
Quanto mais cedo a gente começa a pensar no futuro, melhor. Várias escolas de São Paulo juntam as duas pontas da vida.
“Eles são legais e eles sempre ensinam alguma coisa boa”, diz uma menina.
“O trabalho é feito no sentido de conscientizar, começa com os avós, depois eles estudam o Estatuto do Idoso, depois eles aprendem as músicas, porque fica na memória, fica no conhecimento, mas fica no coração também”, destaca a professora de música Adriana Francato.
Fica a lembrança de um dia bom e a ideia de que o futuro vai chegar, por mais distante que pareça.
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