Como as nossas relações influenciam o envelhecimento


Ter uma boa rede de apoio também na vida real é um fator indispensável para envelhecer com mais qualidade de vida

Na minha última coluna, falei do ambiente físico como um determinante do envelhecimento ativo. O ambiente social é outro determinante de igual importância. O apoio social, por meio das redes sociais (não as virtuais, mas as verdadeiras), com família, amigos, colegas e vizinhos; oportunidades para educação e aprendizagem e proteção contra violência e abuso também são fatores-chave para envelhecer bem.

Este artigo foi publicado originalmente no portal Viva a Longevidade.

Por outro lado, a experiência de violência e abuso, insegurança, analfabetismo e exclusão social gera desvantagens e riscos que podem contribuir para a dependência e para doenças na velhice.

Nesta coluna, então, vou falar sobre aspectos do ambiente social nos quais devemos investir o quanto antes para envelhecer bem. Esse “quanto antes” pode ser mesmo aos 60 ou 70. O que importa é estimular mudanças positivas, mesmo quando muitos acham que já está tarde demais. Porque, na verdade, nunca é tarde demais – mas quanto mais cedo, melhor.

 

O ser humano é um ser social

Inúmeros estudos demonstram a forte relação entre o apoio social e a saúde física e mental. O que esses estudos evidenciam, podemos também sentir na nossa própria pele: quando cercado por amigos que querem nosso bem, que mantêm um estilo de vida saudável e ainda nos dão uma mão ou um bom conselho quando precisamos, normalmente, nos sentimos mais protegidos e menos estressados.

Se, por outro lado, estamos em um ambiente hostil, sem ou após a perda de conexões afetivas ou ainda cercado por pessoas com as quais vivemos em conflito, estamos nos sentindo mais estressados e talvez venha aparecendo uma dor de cabeça ou nas costas, que – se esse nível de estresse for mantido – pode se tornar uma doença crônica com sérias consequências.

Pesquisas mostram que redes sociais adequadas podem fortalecer nosso bem-estar emocional, reforçar hábitos saudáveis e melhorar as oportunidades para educação

De fato, pesquisas mostram que redes sociais “adequadas” podem fortalecer nosso bem-estar emocional, reforçar hábitos saudáveis e ainda melhorar as oportunidades para educação, serviços, emprego e informação.

Essa associação se mantém ao longo do processo do envelhecimento; assim, pessoas idosas com redes sociais mais fortes têm menor risco de ter problemas de saúde, especificamente doenças cardíacas, e têm uma saúde mental melhor. Um estudo brasileiro mostrou ainda que a reciprocidade em relações de apoio social é importante para o bem-estar psicológico de pessoas idosas (conteúdo em inglês).

Essa reciprocidade também é uma componente importante para o engajamento social, seja por meio de ajuda ao próximo – por exemplo, o vizinho doente— ou através de ações voluntárias. O benefício é para ambos: de quem doa seu tempo e de quem se beneficia dessa ação. Há cada vez mais evidência sobre o impacto positivo para a saúde e o bem-estar, também especificamente para os mais idosos.

 

Educação

Ter acesso à educação cedo na vida contribui para o desenvolvimento de capacidades necessárias para conseguir um bom emprego, para lidar bem com desafios da vida e para cuidar bem da própria saúde.

A evidência é clara: pessoas com maior escolaridade vivem mais e com mais saúde do que pessoas com um menor grau de escolaridade. A educação leva a uma maior e mais segura renda, melhores condições de trabalho e de moradia – fatores que em si só já contribuem para uma melhor saúde.

Com maior nível de educação também vem maior conhecimento sobre promoção de saúde e, consequentemente, maior probabilidade de seguir hábitos de vida mais saudáveis. E educação também é um protetor da saúde cognitiva: idosos com maior grau de escolaridade têm menor risco de desenvolver demência.

Quando falamos em educação, não importa apenas a educação formal, ou seja, o ensino básico, fundamental e superior. Há também cada vez mais estudos sobre a importância da aprendizagem ao longo do curso de vida, que contribui para maior autoconfiança, participação social e econômica, e estilos de vida mais saudáveis. Não vou entrar em mais detalhe aqui para ainda abordar o tema da aprendizagem ao longo do curso de vida, o famoso lifelong learning, numa próxima coluna.

Reforçar os laços de amizade ao longo da vida nos ajuda a enfrentar com mais leveza os nossos momentos difíceis

Vivendo às margens da sociedade

Sentir-se excluído e sem seus direitos protegidos, em qualquer país, rico ou pobre, traz sérios riscos para a saúde. Os motivos para a exclusão social são vários. Pessoas podem ser excluídas, entre outros, pela falta de recursos financeiros, por viver em áreas inseguras ou por pertencer a um grupo discriminado pela sociedade.

O que também acontece é que pessoas idosas se sentem excluídas socialmente pelas mudanças às vezes drásticas na vizinhança, que as fazem sentir estrangeiras na própria comunidade.

A perda de mobilidade muitas vezes resulta em um isolamento da pessoa idosa ou por vontade própria da pessoa que prefere se retrair da sociedade, ou pela sociedade que não sabe lidar com as limitações que a pessoa vem enfrentando.

Com esse exemplo, podemos ver novamente como todos esses fatores que estamos abordando nestas colunas estão interligados: um idoso que, por exemplo, teve uma queda e está com medo de cair novamente vai evitar ambientes menos acessíveis.

Não vai mais ao aniversário do neto que é celebrado no segundo andar de um prédio sem elevador. Não se encontra mais com os amigos para jogar baralho por não ter como ir até o botequim. E não é mais chamado para assistir à peça na qual a filha atua, porque o genro não pode dispensar meia hora a mais para ir ao teatro com o sogro num ritmo mais lento.

Ele também vai hesitar mais quando for a hora de fazer um exame periódico e talvez deixe de frequentar a Universidade Aberta da Terceira Idade. Porém, com um pouco de sensibilidade e esforço, a sociedade pode contribuir, e muito, para que esse idoso continue incluído e ativo.

 

Em resumo

Para viver muito e viver bem, então, não é suficiente cuidar da alimentação, fazer atividade física, evitar álcool e escolher um ambiente físico adequado. É preciso investir no nosso capital social, em relações sociais e educação. É preciso também, fazer a sua parte para diminuir a exclusão social e prevenir violência e abuso. Isso acaba não só beneficiando o outro, mas também a nós próprios.

Como todos os demais fatores, o ambiente social também oferece fatores de risco e de proteção, aos quais estamos expostos a vida inteira e cujas consequências sentimos na velhice.

Esses determinantes têm forte inter-relação um com o outro. Com uma educação melhor, você aumenta as chances de conseguir um bom emprego e assim maior segurança financeira, ter mais conhecimentos para cuidar melhor da sua saúde, ter seus direitos protegidos e viverá em um ambiente mais propício.

Ou ainda, com uma boa rede social, situações difíceis que possamos enfrentar ao longo do curso da vida como doenças, desemprego ou a perda de um ente querido ficarão menos traumáticas. Com isso, superamos as dificuldades com mais facilidade e assim diminuímos o impacto negativo das mesmas na nossa saúde.

Este artigo foi publicado originalmente no portal Viva a Longevidade.


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